É preciso apenas ouvir
(Imagem retirada da Internet)
Se anteriormente me metia dentro do carro a ler um livro na hora de almoço, agora tornou-se impossível com esta temperatura tropical. Para não morrer sufocada tenho tido na minha pausa momentos perfeitos, a sombra, o livro e o banco de jardim no meio da cidade. Hoje num desses momentos, estava eu sentadinha, agarrada ao meu livro, mal observando quem passava à minha frente, quando um senhor, de já tenra idade pede autorização para se sentar, à qual acedi com facilidade. O senhor sentou-se e começou a falar, olhando sempre em frente para as árvores, contando-me o seu fim-de-semana. Dizendo que vivia sozinho ali na cidade e que os filhos estavam já casados, mas que viviam longe e que de vez em quando ia àquele jardim depois do almoço para apanhar ar fresco.
O senhor começou a falar com tanta facilidade como quem conta uma história e eu poucos comentários fui fazendo, passando de ouvinte atenta a pessoa meia dividida com a leitura. A verdade é que no fim o senhor agradeceu-me.
- De quê? - questionei eu. Afinal, ouvir é grande parte do meu trabalho com a idade adulta.
- De ouvir, nem toda a gente ouve como a menina. Obrigada e bom trabalho. - E lá foi ele pelo jardim fora para ainda ir tomar o seu café.
A verdade é que aquele homem de idade já avançada apenas precisava de conversar, apenas precisava de fugir um bocadinho da sua solidão e ser ouvido. Os meus doente sofrem da mesma doença 'necessidade de serem ouvidos', quantas são as sessões em que 15 minutos são apenas a ouvir as suas histórias de quando estavam em Moçambique, ou de quando a fábrica X fechou ou deu muito lucro? Quantos são os que me contam momentos da infância e que falam dos irmãos já falecidos? Imensos! E o que me apercebo, é que com a idade vem a solidão. E com ela a voz que se cansa, apesar da vontade que ainda existe para falar, mas que tão pouca gente quer ouvir.
E hoje, mais do que nunca, apercebi-me que é preciso apenas ouvir. Ouvir quem se senta ao lado no banco de jardim. Ouvir os doentes que não têm mais com quem falar. Ouvir o estranho que se senta na mesa ao lado do café. Apenas é preciso ouvir.