Dia de Regressos Inimagináveis de uma Terapeuta da Fala
(Imagem retirada daqui)
Jamais, em toda a minha vida, pensaria num regresso às escolas como o de hoje. Desde que me formei em Terapia da Fala, já lá vão 7 anos, que o contexto escolar era o meu objetivo. Adoro apanhar os miúdos na fase de aquisição da Leitura e Escrita e estas acabam por ser as minhas áreas de intervenção preferidas, juntamente com a Linguagem. Sempre desejei, como terapeuta da fala, trabalhar a tempo inteiro numa escola, em 2018 tive essa sorte e concretizei um dos meus objetivos e até hoje digo que estou no meu ambiente natural e onde gosto mais de trabalhar, no meio (também) natural das crianças. No entanto, este ano foi um regresso bastante diferente às escolas, um regresso como numa tinha imaginado na vida.
Após 6 meses longe das crianças, após 6 meses do encerramento das escolas o regresso aconteceu e apesar do entusiasmo e o desejo de voltar, a verdade é que o receio veio sempre aliado a todos os outros sentimentos. A chegada desta pandemia, de uma forma tão inesperada e tão intensa fez com que tudo à nossa volta tivesse de mudar, mas o que mais mudou foi a forma como as crianças vêem o mundo e como terão de lidar com ele. As mil e quinhentas regras que lhe estão a ser impostas, o distanciamento social, as máscaras e até o facto de lhes terem tirado os intervalos como os conheciam fará com que as crianças cresçam de forma condicionada. Estamos a transformar as nossas crianças, sei que é necessário, que no fundo é tudo por uma questão de saúde pública, mas fico triste por eles, até porque as regras não foram feitas a pensar neles. Em que mundo dez minutos de intervalo é saudável para crianças entre os 6 e os 10 anos?
Até a terapia teve de ser transformada, eu que me sentava lado a lado com eles, como se fossemos companheiros da aprendizagem já não o poderei fazer, os jogos que não podem ser desinfectados já não poderão fazer parte da nossa rotina e o mais difícil de tudo? Os abraços, os miúdos adoram abraçar, nem lhes pedia, tomavam sempre essa iniciativa e agora? Agora ensinamos-lhes que não pode ser, que não se deve fazer isso, que tudo à nossa volta é diferente. Sinto uma ansiedade em estar com os meus meninos, mas ao mesmo tempo uma tristeza por as coisas não poderem ser como já foram. Para mim irá ser um desafio profissional, mantê-los motivados sem contacto, sem trocas de materiais e com inúmeras regras, mas para eles? Para eles a terapia nunca mais será a mesma, a escola nunca mais será a mesma e receio, receio o tipo de imposições que lhes estamos a colocar e as suas implicações no futuro.
Este é sem dúvida um regresso muito desejado, mas com um sabor agridoce. Que pelo menos seja um bom regresso para todos!