Há entrevistas esquisitas
(Imagem retirada daqui)
A última entrevista que tive, apesar de ter sido a que me deu o presente emprego, foi das mais invasoras em que participei. Tinha ido a uma primeira entrevista, em que fui apanhada desprevenida para escrever e falar em inglês, mas na qual me senti super bem e a qual se tornou numa das melhores entrevistas que tive até ao dia de hoje (lembram-se das minhas entrevistas parvas, não se lembram?). A segunda entrevista, desta vez com a entidade empregadora, foi das mais invasoras, pessoais e esquisitas que também tive até aos dias de hoje.
Inicialmente, tudo completamente normal, dados básicos sobre a entrevista passada, informações sobre as funções, sobre a minha morada e a minha experiência. A partir daí só não disse o meu peso porque o patrão não pediu, senão até isso teria dito. A entidade perguntou-me quantos irmãos tinha, a idade deles, o meu percurso académico, a idade dos meus pais, se tinha carro, até ao momento em que me pergunta como paguei o carro.
"Não paguei, a minha cunhada ofereceu-mo porque tinha de comprar um porque ia ser mãe." - respondi eu com a maior naturalidade possível.
"Então a sua cunhada deve gostar muito de si." - responde-me o homem a sorrir e eu apenas confirmei que considerava correcta a afirmação. - "Então teve uma vida muito facilitada." - a esta questão respondi com a maior naturalidade possível, quase esquecendo que estava numa entrevista a um emprego.
"Facilitada? Nem por isso, sempre tive que lutar pelo que quis." - o sorriso foi inevitável e quase que demonstrei o quão absurda era a afirmação daquele homem.
"Então porquê?" - o ar de admirado dele impressionou-me, eu sei que tenho ar de menina, mas já não o sou há uns bons anos.
"Ora porque se estudei foi porque tive bolsa e lutei para sempre a manter. Se tenho carro foi porque a minha cunhada o deu, porque senão não teria carro e além disso ando a trabalhar à noite, por alguma razão há de ser. Além de que até já trabalhei na área da produção numa fábrica." - isto era eu, a tentar ser o mais resumida possível, mas o homem quis saber ainda mais e ainda perguntou:
"Mas porque isso aconteceu?" - e lá tive eu de contar a lenga-lenga de que os meus pais tinham tido um negócio de muitos anos, que tinha ido à falência e que tinhamos ficado com dívidas até às orelhas e que por isso sempre tive de lutar para ter o que tinha, que a minha vida de facilitada nada tinha tido. E foi quando me apercebi que estava a contar àquele estranho a história da minha vida, aliás, pormenores da minha vida que nem amigos com quem convivi muito tempo sabiam. Numa entrevista de emprego dei por mim a ser questionada sobre a minha vida pessoal, sobre a minha história e sobre a pessoa que era. Bem sei que ele também tinha feito um resumo da sua própria vida, mas ainda assim saí de lá com a sensação de que tinha dito de mais, principalmente quando me questionou: "É saudável? Fica doente muitas vezes?", a esta questão nem falei das minhas alergias, da minha intolerância e muito menos das minhas faringites, apenas afirmei que sim, que era e sou uma pessoa saudável.
Apesar desta ter sido uma das entrevistas mais estranhas, hoje, conhecendo um bocadinho do meio em que me fui integrar, compreendo as questões daquele dia. O homem queria saber se eu me adaptava a uma nova profissão, se era apenas uma menina que queria ser adulta ou se realmente sabia o que era a vida. O patrão apenas queria saber se realmente era lutadora ou se me deixava ficar e se tinha a papinha sempre feita.
A verdade é que apesar da entrevista estranha, hoje estou lá a trabalhar e até estou a gostar (mesmo não sendo aquilo que idealizava para o meu futuro).
Há entrevistas estranhas, mas pelo menos esta teve um final 'feliz'