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justsmile

22
Jul16

Há entrevistas esquisitas

(Imagem retirada daqui)

 

A última entrevista que tive, apesar de ter sido a que me deu o presente emprego, foi das mais invasoras em que participei. Tinha ido a uma primeira entrevista, em que fui apanhada desprevenida para escrever e falar em inglês, mas na qual me senti super bem e a qual se tornou numa das melhores entrevistas que tive até ao dia de hoje (lembram-se das minhas entrevistas parvas, não se lembram?). A segunda entrevista, desta vez com a entidade empregadora, foi das mais invasoras, pessoais e esquisitas que também tive até aos dias de hoje.

Inicialmente, tudo completamente normal, dados básicos sobre a entrevista passada, informações sobre as funções, sobre a minha morada e a minha experiência. A partir daí só não disse o meu peso porque o patrão não pediu, senão até isso teria dito. A entidade perguntou-me quantos irmãos tinha, a idade deles, o meu percurso académico, a idade dos meus pais, se tinha carro, até ao momento em que me pergunta como paguei o carro.

"Não paguei, a minha cunhada ofereceu-mo porque tinha de comprar um porque ia ser mãe." - respondi eu com a maior naturalidade possível.

"Então a sua cunhada deve gostar muito de si." - responde-me o homem a sorrir e eu apenas confirmei que considerava correcta a afirmação. - "Então teve uma vida muito facilitada." - a esta questão respondi com a maior naturalidade possível, quase esquecendo que estava numa entrevista a um emprego.

"Facilitada? Nem por isso, sempre tive que lutar pelo que quis." - o sorriso foi inevitável e quase que demonstrei o quão absurda era a afirmação daquele homem.

"Então porquê?" - o ar de admirado dele impressionou-me, eu sei que tenho ar de menina, mas já não o sou há uns bons anos.

"Ora porque se estudei foi porque tive bolsa e lutei para sempre a manter. Se tenho carro foi porque a minha cunhada o deu, porque senão não teria carro e além disso ando a trabalhar à noite, por alguma razão há de ser. Além de que até já trabalhei na área da produção numa fábrica." - isto era eu, a tentar ser o mais resumida possível, mas o homem quis saber ainda mais e ainda perguntou:

"Mas porque isso aconteceu?" -  e lá tive eu de contar a lenga-lenga de que os meus pais tinham tido um negócio de muitos anos, que tinha ido à falência e que tinhamos ficado com dívidas até às orelhas e que por isso sempre tive de lutar para ter o que tinha, que a minha vida de facilitada nada tinha tido. E foi quando me apercebi que estava a contar àquele estranho a história da minha vida, aliás, pormenores da minha vida que nem amigos com quem convivi muito tempo sabiam. Numa entrevista de emprego dei por mim a ser questionada sobre a minha vida pessoal, sobre a minha história e sobre a pessoa que era. Bem sei que ele também tinha feito um resumo da sua própria vida, mas ainda assim saí de lá com a sensação de que tinha dito de mais, principalmente quando me questionou: "É saudável? Fica doente muitas vezes?", a esta questão nem falei das minhas alergias, da minha intolerância e muito menos das minhas faringites, apenas afirmei que sim, que era e sou uma pessoa saudável.

Apesar desta ter sido uma das entrevistas mais estranhas, hoje, conhecendo um bocadinho do meio em que me fui integrar, compreendo as questões daquele dia. O homem queria saber se eu me adaptava a uma nova profissão, se era apenas uma menina que queria ser adulta ou se realmente sabia o que era a vida. O patrão apenas queria saber se realmente era lutadora ou se me deixava ficar e se tinha a papinha sempre feita.

A verdade é que apesar da entrevista estranha, hoje estou lá a trabalhar e até estou a gostar (mesmo não sendo aquilo que idealizava para o meu futuro).

Há entrevistas estranhas, mas pelo menos esta teve um final 'feliz' 

10
Mai16

Vida de desempregada #17

(Imagem retirada daqui)

 

Tempo de desemprego: 242 dias.

Número de anúncios na área: 29 (talvez menos?).

Número de anúncios respondidos fora da área: perdi-lhes a conta.

Número de entrevistas: 2+5 (2 fora da área e 5 na área).

Número de currículos entregues em mão e via online: recuso-me a contar, a última vez eram 302.

Respostas: 37.

 

Há oito meses desempregada e deparei-me com uma nova relação com a esperança. Apatia. Há minha volta as situações de desilusão têm sido mais frequentes que comigo própria. Quando recebo um 'não' parece-me que Ele e os meus pais ficam mais desiludidos que eu própria. Aprendi neste tempo todo que não vale a pena criar expectativas elevadas, que as quedas são mais dolorosas e que normalmente vêm acompanhadas por uma lágrima ou outra, contudo as pessoas que me rodeiam parecem ter mais esperança que eu em cada pequeno sinal que aparece. Sei que esta é a minha forma de protecção e que, apesar de não ser agradável levar um não atrás de outro, é mais fácil lidar com a esperança adormecida do que com a desilusão. 

Ao fim de oito meses ando mais que cansada e com esta chuva insistente entre três dias de sol (arre! Mas estamos mesmo na primavera???), sinto-me psicologicamente a ficar atrofiada. Tenho estudado, tenho saído, tenho feito ainda mais doces, mas estou a chegar a um ponto de não só cansaço psicológico como físico. Dores de cabeça, demasiado sonolenta e uma preguiça inabalável para fazer seja o que for. Luto contra a tendência e não me deixo ficar, mas admito que não é fácil. Este último mês foi o mês de modificar o meu currículo e até tive mais uma entrevista em que só não saí de lá milionária porque não quis. No entanto, apesar do cansaço, desta esperança que prefiro manter adormecida temporariamente e de tudo o resto, continuo a acreditar que esta espera terá toda uma razão que um dia me será explicada, assim como sei que no fundo sou feliz. Apesar de nem todos os dias me conseguir agarrar a estas máximas, a maioria dos dias ando bem. Acho que será normal esta variação de humores. Digam-me que é normal!

Ando na elaboração de um Plano C, pois parece-me que o B não vai para a frente e este C, só de pensar já cansa. Mas a verdade é que tenho andado minimamente bem. Tenho mantido a sanidade mental, uns dias melhor que outros, e continuo a acreditar que mais tarde ou mais cedo tudo se irá resolver. Não sei onde, não sei como e muito menos o quando (que é a parte mais assustadora), contudo tenho a certeza que a situação se virá a resolver.

No fundo, não podemos ficar sempre no mesmo sítio, certo?

 

05
Mai16

'Só não é rica porque não quer!'

(Imagem retirada daqui)

 

O meu fortúnio em entrevistas de outro mundo continua. E a seguinte tem sempre a capacidade de superar a anterior em 'top' de ridicularidade. Após ter omitido informações no meu currículo fui chamada para uma entrevista a qual o anúncio de emprego tinha como título 'administradora/secretária'. Com uma chamada tão rápida quanto o envio do currículo fiquei imediatamente de pé atrás, ainda questionei se seria trabalho na área de vendas, mas a senhora não me disse sim nem que não. Ainda assim lá fui eu à entrevista, sempre pensando que me iriam apresentar um trabalho de vendas a comissões, do qual tenho vindo a fugir a sete pés (relembro que nem para vender um calendário eu tenho jeito).

Apresentei-me atempadamente na empresa, não era muito longe nem muito perto, mas pelo menos conhecia a zona.  Preenchi uma ficha de inscrição e depois foi só esperar para ser chamada por um homem, com os seus 40 e muitos anos, com a barba de três dias por fazer, uma gravata a apertar o pescoço na zona onde faltava um botão na camisa e um cabelo bem puxadinho para trás com gel (ou até mesmo brilhantina). A primeira coisa que notei, contudo, foi o cheiro nauseabundo a perfume que todas as salas daquele velho prédio tinham (agora pensem, se eu sou pouco sensível a cheiros senti, imaginem as outras pessoas!). Sentei-me na cadeira indicada pelo senhor e fui bombardeada por mil e uma informações inúteis que nada tinham a haver com o cargo, a função da empresa, o negócio da empresa e até mesmo com as condições do emprego. Levei uma lição de vida muito semelhante à minha primeira entrevista fora da área. Quando finalmente me foi feita uma pergunta sobre a área em que queria trabalhar respondi facilmente 'em qualquer uma, mas como isso é muito vasto sei facilmente dizer-lhe em que áreas não quero trabalhar: call-centers e vendas a comissões'. BINGO! Toquei no ponto sensível, ao que o senhor me começa com aquele fabuloso paleio de como nós (recém-licenciados, apesar de achar que já não me enquadro neste grupo, porque de recém já não tem nada) não queremos trabalhar, queremos ter uma vida facilitada, que se eu não quero estas áreas é porque no fundo não quero trabalhar, e mil um outros blá blá blás que em nada são úteis para a minha existência. Mostrei-me pouco flexível, inicialmente, dizendo-lhe que preferia trabalhar em produção (como já trabalhei numa fábrica) do que dar a cara por um produto, algo que não tenho minimamente jeito. Até limpezas disse que faria! Ora, a conversa mudou totalmente de direcção, começou a falar da minha beleza, que 'preciso de sair da escuridão e vir para a luz apanhar sol, mas com cuidado e sempre com um bom professor', que não posso ficar nos bastidores porque sou uma mulher bonita, inteligente e com bom poder de comunicação. Só lhe faltou dizer que eu era maravilhosa e perfeita, até me disse que não me poderia contentar com um ordenado de 600€ à porta de casa (isto porque 5 minutos antes eu tinha-lhe dito que na fase em que estou uma proposta assim me satisfaria as necessidades). No meio de tanta coisa ainda fiquei a saber a carreira profissional do senhor, os problemas médicos, as ambições de criança e o negócio de um casamento que (aparentemente) lhe correu mal. Sobre o trabalho da empresa e sobre o que ela fazia? ZERO! NADA! NENHUM! Essa informação ficaria para um primeiro dia de experiência, no qual fiquei de me apresentar (acho que o senhor acredita no pai natal).

Enquanto estive nesta entrevista apercebi-me de três coisas:

1. A necessidade de fingir que ouvia o homem, parando de lhe dar respostas à altura, para ver se ele se calava.

2. A vontade de me levantar e sair porta fora com duas palavras: 'Vá pastar!'.

3. A lavagem cerebral que esta gente tenta fazer.

Este terceiro ponto, se me deixou profundamente irritada, deixou-me também de certa forma fascinada. O paleio que esta gente consegue ter, fazendo-nos acreditar (ou pelo menos tentam) que vamos ficar ricos sem nos darem a mínima informação, é simplesmente fantástico. A forma como nos tentam fazer culpados por não aceitarmos a oferta, de tão boa que ela é, porque afinal parece que não estamos tão interessados assim em trabalhar, ou porque não precisamos de dinheiro como toda a gente. E depois, o paleio em que nos enchem de elogios como se nunca tivesse surgido naquele gabinete alguém tão espectacular como nós para o cargo oferecido. A forma como estes chefes falam (afinal já é a segunda entrevista assim a que vou) parece realmente uma sessão de lavagem cerebral para ver o mundo maravilhoso daquele negócio e em como fomos feitos para a posição de vendedores. Vá, o senhor nunca me disse que era para ser vendedora, mas também nunca o negou. Acredito, depois desta entrevista, que é muito mais fácil do que pensava cair nas mãos destes empregos milionários em que só não é rico quem não quer, basta alguém ter mais alguma inocência que eu e menos força para dizer um 'não' que são empurrados para um emprego em que nem as condições são conhecidas.

Ah! E já agora, uma dica para todos os entrevistadores, não digam que os licenciados não aceitam estes empregos porque não querem trabalhar (principalmente logo na segunda frase), fica-vos mal e já soa a um cliché batido. Os licenciados são apenas pessoas com mais conhecimentos e que não querem ser escravizados por qualquer um.

 

P.S.1: Depois de mais uma aventura de entrevistas penso, deverei escrever um livro só de entrevistas? É que só me têm saído 'duques'. 

P.S.2: Por isso, gente desempregada, só não somos ricos porque não queremos.

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