E se não tivesse existido o 25 de Abril?
(Imagem retirada daqui)
Fecha um bocadinho os olhos e vamos imaginar que o dia 25 de Abril nunca tinha acontecido. Fecha os olhos e esquece a tua vida como a conheces, esquece o mundo como sempre o viste e agora lê e imagina.
Estamos em 2018, Salazar nunca deixou de governar o país, a PIDE nunca deixou de existir e os livros de história falam apenas nos sucessores do grande Salazar, aquele grande homem que deu a Portugal a sua vida. Está no governo um outro Salazar, já passaram mais de 40 anos desde que ele caiu da cadeira, mas as suas regras, a sua crença na religião e na família mantém-se. São os valores patrióticos que Portugal nunca perdeu, ao contrário do resto da Europa que se deixou corromper àqueles liberalistas.
O povo vive feliz. Sorri por ter emprego, pena ainda poucos conseguirem comprar casas e só os filhos dos grandes senhores conseguirem estudar, mas o povo é feliz. Ontem, a filha da Sr. Clementina veio a chorar ter com a mãe a dizer que o marido lhe bateu, a mãe, coitada, passou tal vergonha que a obrigou a voltar para casa e a pedir desculpa ao marido pela difamação. Já a D. Clementina lembrou que amanhã não estará cá, falta só o marido assinar a autorização e ela finalmente poderá ir visitar os pais que emigraram para a França desde que ela se lembra, pode ser que ele esteja de bom humor e deixe a pobre coitada ir. Ela diz que vai na TAP, lá fora há companhias aéreas mais baratas, mas o novo Salazar diz que tem de proteger o que é do povo. Um irmão da D. Clementina diz que não compreende como é que um país como Portugal não deixa ter Facebook na internet (nem sei bem o que isso é), afinal seria bem mais fácil matarem um bocadinho as saudades de quem emigrou. Sem a minha mãe saber pedi-lhe para me trazer uma coca-cola, dizem que é muito boa, ela prometeu me que vai tentar trazer escondida na roupa.
Vivemos num país feliz, de boas notícias nos jornais, de novelas Portuguesas e nada do que é estrangeiro entra cá em casa que o pai não permite! É claro que continuam a haver os revolucionários, os clandestinos, mas os meus pais dizem que são uns vagabundos que não querem é trabalhar, querem sé ser ricos e criar problemas! E vêm eles com aquelas ideias revolucionárias, claro que depois vão todos presos, uns até desaparecem!
O Clementino, o meu noivo, trabalha numa boa fábrica e eu também, estamos a tentar arranjar o nosso cantinho para começarmos a vida. A mãe tem-me ensinado a passar a roupa a ferro e ando a aprender os cozinhados preferidos dele com a minha futura sogra, quero agradar o meu marido e deixa-lo descansar quando chega do trabalho. Afinal eu serei a dona da casa. Um dia quis ser médica, mas hoje compreendo o quão ridículo isso seria nos dias que correm, é mais importante ser uma dona de casa do que outra coisa qualquer.
Hoje vi na esquina a nova fotonovela, em segredo uma amiga que foi ao estrangeiro com os pais disse que isso lá fora não existe, mas que viu na internet uma coisa chamada YouTube que tem tudo, novelas, filmes, músicas e até algumas coisas indecentes. Ainda bem que não há nada disso em Portugal.
Estamos em 2018 e ainda bem que o Salazar construiu este belo país!
Isto é o que poderia ter acontecido se o 25 de Abril nunca tivesse existido. Estas palavras poderiam ser reais se em 1974 um grupo de homens não tivesse tido a coragem de lutar pela liberdade.
Percebes agora porque é tão importante o 25 de Abril? Percebes agora porque é tão importante a liberdade?